4 de junho de 2009

#33 [Parte 1 - Será que me deixam?]

A forma mais fácil de encontrar respostas será, provavelmente, definir um universo mais pequeno para melhor conseguir definir alguns parâmetros.

Sou muitas vezes apelidado de ingénuo e irresponsável. Ingénuo por acreditar que existe uma solução e irresponsável por ter bastante dificuldade em aceitar alguns, muitos, dos parâmetros da nossa sociedade actual.

Começo por dizer que não peço desculpa por ser assim.

Vivemos numa sociedade, ocidental, que nos faz crer que somos todos iguais, brancos, pretos, amarelos, homens, mulheres, atrasados, pequenos, grandes, gordos, magros e um sem número de igualdades forçadas. Obviamente que se trata tudo de teoria e na minha forma, teimosa, de observar e analisar as coisas tudo isto não é mais do que uma grande falácia.

Como posso eu ser igual a um asiatico ou a um africano? Gosto de utilizar as crianças como exemplos por considerar que são seres humanos no estado mais selvagem e puro. As crianças não têm que carregar o peso da hipocrisia da sociedade, limitam-se a observar, analisar e concluir baseados apenas na sua lógica natural. Uma criança vê um preto, não vê um afro-europeu ou PALOP; uma criança comunica directamente com o cerebro, um adulto por sua vez já utiliza todo o conhecimento social adquirido e absorvido no decorrer da sua vida.

Facilmente se chega esta conclusão com uma pequena experiência.

Imaginem uma situação. Vão jantar a casa do vizinho com o vosso filho de 6 anos e a comida que vos é servida tem um sabor bastante estranho e desagradável.

Anfitrião: A comida está saborosa?

Criança: Não gosto, não quero mais.

Adulto: Está excelente, vou repetir.

Que aconteceu aqui? Se partimos do principio que o paladar não é algo subjectivo, que o é, mas partimos do principio que é algo objectivo. A criança, após fazer uso das suas capacidades naturais, analisa o paladar e envia uma mesagem negativa ao cérebro que, por sua vez, envia à fala e comunica ao mundo exterior as suas conclusões. Não gosto.

No caso do adulto a situação torna-se mais complicada, utiliza as capacidades humanas naturais para chegar a uma conclusão lógica e aplica os bloqueios sociais correspondentes ao contexto. Resumindo, mente.

Ao retornar a casa após o jantar, por magia, as conclusões alteram-se. A criança, obviamente, mantem o mesmo discurso, no caso do adulto a situação altera-se drasticamente. O adulto, livre dos bloqueios sociais, consegue libertar o caminho para a verdade e comenta a má qualidade da refeição.

Volto a colocar a questão e acrescentar outra. O que se passou aqui e o porquê?

A resposta é simples e complicada ao mesmo tempo. Como é obvio a criança, felizmente, não tem a responsabilidade social de um adulto e não se rege por um sem número de regras sociais, regras essas que atrás denominei de bloqueios.

Infelizmente não vivemos numa sociedade livre onde cada um é livre de pensamento e opinião, pelo contrário, vivemos numa sociedade de regras e conceitos que nos “obrigam” a seguir um padrão único social. Padrão esse que é uma ilusão, não existe tal coisa de igualdade, não existe, e não pode, um tipo de pessoa, não existe uma só forma de pensar e viver, no máximo existem 6 mil milhões de formas de viver porque cada ser/pessoa vê e analisa o mundo à sua volta de forma diferente.

O que na realidade acontece é a obrigação geral de cumprir um padrão de vida pré definido, copiar os bons exemplos e colocar de parte os maus. Mas quem pode ter a ousadia de definir o que é bom e mau para mim? Quem pode saber o que me faz feliz se não eu próprio? Quem define os conceitos sociais tais como a preguiça, ganancia, beleza, responsabilidade senão nós próprios? O que para mim é belo poderá ser horrível para outro e não há forma de alterar essas opiniões senão utilizando frequentemente a mentira. Porque não gostamos e não o podemos dizer, queremos mas não o podemos negar, andamos por outros caminhos mas temos que andar na linha e um sem fim de bloqueios que nos impedem de ser nós próprios.

Como passamos de criança para adulto?

Como conseguir formatar 6 mil milhões de pessoas à mesma imagem?

Ao nascer somos retirados das nossas mães e entregues a alguém que, além de nos alimentar fisicamente, alimenta-nos de regras e preceitos. Não podes fazer isto, não podes dizer aquilo, não podes agir assado, o molde começa a formar-se. Vamos para a escola começa a formatação à séria, é nos incutida a competição, “sempre o melhor” é o lema principal: melhores notas, melhor comportamento, melhor roupa, melhor telemóvel, melhor tudo, caso contrário é uma criança complicada, sem padrões sociais e, obviamente, a culpa é imediatamente colocada na falta de capacidade educativa dos pais nunca na sociedade. Mais tarde vem a faculdade, o trabalho, os filhos e o ciclo completa-se, tudo o que foi assimilado será passado ao próximo e por aí adiante. Todos os conceitos de “bem viver em sociedade” são passados e isso torna-se no objectivo de vida de cada um.

A vida é curta, todos nós temos essa noção, frases como “viver um dia de cada vez” e afins tornaram-se clichés para a grande maioria, transformaram-se num sonho, uma utopia. Vivemos uma vida a ansiar o que não temos e esquecemos o que temos. Vivemos a sonhar em Cristiano Ronaldo e Madonna quando esquecemos as pessoas que nos estão próximas, vivemos uma vida de ilusão permanente.

O grave disto não é acontecer, o grave é não deixar-mos que existam outros que se recusam a viver desta forma. Esses não fazem parte, são nos estranhos e por vezes tomamo-os como perigosos e loucos, deixam de existir. Temos que combater esse sentimento e em vez de fomentar-mos a igualdade hipócrita, em vez de querer-mos acreditar que somos todos iguais temos que nos realizar que não o somos, cada um de nós é único. Só depois de conseguirmos viver em conjunto respeitando essa diferença incontornável e aprender-mos a viver com ele e em conjunto é que podemos ser completamente livres.

Uma das formas mais antigas de controlo de massas é o medo. Medo de perder o que se tem, medo dos outros, medo dos terroristas, medo dos assaltos, medo do vizinho, medo de reclamar, medo de exprimir, medo de conduzir, medo da policia, medo do fisco, medo do patrão, medo da mulher, medo do marido, medo do cão, medo, medo, medo. Ao manter uma sociedade baseada no medo consegue-se controlar e retira praticamente tudo à população, todos os direitos, todas a liberdades, todas a opiniões, todas as formas de expressão individual. Como uma criança facilmente controlável com o medo de perder um brinquedo ou uma hora de tv, nós somos tratados da mesma forma pelos que nos querem manter iguais mas isolados em caixas como galinhas num aviário com um único objectivo, produzir ovos para o dono da quinta.

Eu não quero produzir ovos, nunca nunca ninguém me perguntou se o queria. Eu não quero ser o Cristiano ou o Tom ou o filho da vizinha que ganha mil contos por mês.

Eu só quero ser o Ernesto com todos os defeitos e virtudes.

Será que me deixam?


1 comentário:

Sérgio disse...

Bem, vamos lá ver uma coisa, pegando ai no exemplo do jantar, pra começar as crianças não têm conciencia do trabalho que dá preparar um jantar e depois invertamos a situação...um puto de 5 anos chega ao pé de um adulto com um desenho que ele fez e o adulto com o cerebro ligado directamente á boca vira-se pra ele e diz: "esse desenho não se parece com aquilo que deveria ser, as cores tão todas mal e resumindo tá feio, não tens jeito nenhum pra isso." E agora como é que é?!!! Hum!!!... lá se vai a auto-estima do puto, o incentivo criativo. penso que se resume a uma escolha, mentir é feio?! depende de quem temos á nossa frente, pensem por exemplo na 2 guerra mundial, os franceses ocupados pelos nazis fartaram-se de mentir, isso salvou vidas na altura. A vaidade da razão social tirou mtas.